Tudo começou com uma mancha roxa na tela de um computador em Paris, na França. A mancha, que pairava sobre um pedaço de deserto no leste da Argélia, era o sinal revelador de uma liberação de metano, um gás incolor e inodoro que está turbinando as mudanças climáticas.
O vazamento foi analisado por especialistas do Observatório Internacional de Emissões de Metano (IMEO), que é liderado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Os analistas rastrearam a pluma até o campo de petróleo de Hassi Messaoud, a maior e mais antiga instalação desse tipo na Argélia.
Embora o vazamento tenha sido observado em pesquisas científicas anteriores ao longo dos anos, o IMEO trabalha para fornecer dados sobre metano como esse diretamente aos tomadores de decisão, de forma que sejam acessíveis e passíveis de ação. Os analistas do IMEO enviaram alertas ao governo argelino e à empresa petrolífera nacional e apresentaram as descobertas a ambos durante um treinamento realizado pelo IMEO no país. Em poucos meses, os vazamentos de metano cessaram, uma vitória ambiental semelhante à retirada de 500.000 carros das ruas por um ano, segundo especialistas do IMEO.
A situação ilustrou como a tecnologia está ajudando a reduzir as emissões de metano. No entanto, os especialistas afirmam que a situação também evidenciou que o mundo precisa fazer muito mais para evitar a liberação de um potente gás de efeito estufa responsável por cerca de 30% do aquecimento do planeta.
“Agora os países precisam transformar suas ambições em ações direcionadas e verificáveis”, diz Manfredi Caltagirone, diretor do IMEO.
Atualmente, há cerca de 2,5 vezes a quantidade de metano na atmosfera do que havia durante a era pré-industrial, e as emissões têm aumentado nos últimos anos.
O metano tornou-se o foco da atual Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP29). O Azerbaijão, país anfitrião, planeja pressionar por reduções de metano nos sistemas de resíduos e alimentos, que, segundo estimativas, são responsáveis por 20% das emissões de metano. Outros devem fazer lobby por reduções no setor de energia, que “tem o maior potencial para reduções rápidas e custo-efetivas”, diz Caltagirone.
Criado em 2021, o IMEO do PNUMA reúne dados relacionados ao metano de diversas fontes, incluindo relatórios de empresas, estudos revisados por pares e divulgações governamentais.
Mas um componente importante do observatório é o Sistema de Alerta e Respostade ao Metano (MARS), o primeiro sistema global de detecção e notificação por satélite que fornece dados acionáveis sobre emissões muito grandes de metano. Desde que entrou em operação em 2023, o MARS notificou os tomadores de decisão sobre mais de 1.200 eventos de grandes emissões em cinco continentes. Entretanto, o relatório De olho no metano: invisível, mas não desapercebido (An Eye on Methane: Invisible but not unseen) do PNUMA, divulgado na COP29, mostra que, mesmo que as melhorias na tecnologia tenham tornado os dados mais acessíveis, as emissões de metano continuam a aumentar.
Os vazamentos de metano custam bilhões de dólares por ano ao setor de petróleo e gás. E embora 40% dessas emissões possam ser evitadas sem nenhum custo líquido, o setor ainda não realizou o progresso em larga escala necessário para reduzir as emissões.
Pode haver vários motivos para isso, diz Drew Shindell, presidente do Painel Científico Consultivo da Coalizão Clima e Ar Limpo, convocada pelo PNUMA. Entre eles estão a falta de conscientização sobre a escala das emissões e sobre a economia de custos que poderia advir do fim das liberações de metano.
Isso levou alguns governos a intervir. Shindell destacou o fato de que países como a Nigéria estão introduzindo uma taxa sobre o metano. “É encorajador que, dois anos depois que o metano se tornou uma questão importante, já esteja sendo introduzido um imposto equivalente sobre o carbono”, diz ele.
A União Europeia também está tentando impor um “ajuste de metano de fronteira”, que usaria dados de satélite para entender a pegada de metano do petróleo e do gás importados para a UE.
O esforço para reduzir as emissões de metano tem sido auxiliado pelo monitoramento por satélite e outros avanços tecnológicos, diz Shindell.
No entanto, reduções concretas e em grande escala ainda não se materializaram. O Compromisso Global de Metano, por exemplo, foi lançado há três anos e tem como objetivo reduzir as emissões de metano em 30% dos níveis de 2020 até 2030. Até o momento, 156 países assinaram o compromisso, mas menos de um terço forneceu detalhes sobre suas estratégias de redução, de acordo com a Agência Internacional de Energia.
“Ainda estamos muito longe de cumprir essas promessas”, diz Shindell. “É bom ter ambição, mas no momento é semelhante ao dióxido de carbono - muitas promessas, mas ainda há muito a fazer.”
Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima
A 29ª sessão da Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP29) está sendo realizada em Baku, no Azerbaijão, de 11 a 22 de novembro. Seu objetivo é promover ações sobre as mudanças climáticas, reduzindo as emissões e interrompendo o aquecimento global. Você pode acompanhar as atualizações ao vivo da COP29 no feed de ação climática do PNUMA.
A Solução Setorial para a crise climática
O PNUMA está na vanguarda do apoio à meta do Acordo de Paris de manter o aumento da temperatura global bem abaixo de 2°C e almejando 1,5°C, em comparação com os níveis pré-industriais. Para isso, o PNUMA desenvolveu a Solução Setorial, um roteiro para reduzir as emissões em todos os setores, de acordo com os compromissos do Acordo de Paris e em busca da estabilidade climática. Os seis setores identificados são: energia; indústria; agricultura e alimentos; florestas e uso da terra; transporte; e edifícios e cidades.