Excelências, colegas e amigos,
Esta iniciativa visa desbloquear o potencial da natureza para impulsionar a transformação econômica e social. Há muito tempo, a natureza vem impulsionando a transformação econômica e social. Ou, mais precisamente, a humanidade tem usado a natureza para impulsionar essas transformações.
Tudo vem da natureza. Não só os suspeitos habituais de comida, água, ar e medicamentos. Praticamente todos os objetos ou substâncias que usamos, independentemente de quanto tenham sido processados, começam com a natureza ou na natureza.
Mas sejamos claros. Não estamos usando a natureza. Estamos consumindo a natureza. Levando a natureza e a biodiversidade à exaustão e à destruição. O capital natural caiu 40% em duas décadas. Bilhões de hectares de terra estão degradados. Os ecossistemas e seus serviços estão enfraquecendo.
A base das nossas economias é trêmula. Os meios de subsistência, a segurança alimentar e, na verdade, toda a agenda de desenvolvimento sustentável estão sofrendo. Se a base entrar em colapso, nenhuma quantidade de tecnologia ou inovação humana nos salvará.
Precisamos de uma mudança urgente e radical: de usar a natureza para trabalhar com a natureza. Criar economias centradas na natureza que compreendam a diferença entre preço e valor, entre preço e custo. Priorizar soluções baseadas na natureza como um facilitador fundamental dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Por isso, aplaudo o Brasil e a Indonésia, de quem temos ouvido. Ao estabelecer caminhos econômicos nacionais para usar a natureza de forma sustentável, essas nações estão mostrando liderança. E meus agradecimentos à França, que em breve apresentará novas ferramentas para ajudar a impulsionar a transição.
Apelo a outros países para que se juntem a esta iniciativa. Assumam seus próprios compromissos. E façam o que for preciso para viver em harmonia com a natureza.
Então, o que será preciso?
Primeiro, a implementação do Quadro Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, ou QGB
O QGB é o plano mais ambicioso para a biodiversidade. De todos os tempos. Precisamos de uma abordagem de toda a sociedade, de toda a economia para que funcione. O financiamento é crucial. O Fundo QGB foi lançado em agosto. Encorajo todos os potenciais doadores a contribuírem e a encontrarem outras formas inovadoras de financiar os objetivos do QGB.
A mudança também virá da política interna. Políticas sobre subsídios que levam ao uso excessivo da água, da terra e das espécies. Políticas para limitar a fragmentação dos ecossistemas. Políticas sobre agricultura líquida positiva e resistente e sistemas alimentares circulares que combatam a perda e o desperdício de alimentos.
A biodiversidade está em toda parte: do campo do agricultor às cidades. Precisamos pensar e agir de forma holística.
Dois, contabilizando a natureza
Como eu disse, o capital natural está caindo, mas os governos podem apontar para o crescimento do PIB e dizer que tudo é cor-de-rosa. As empresas podem apontar para os lucros e dizer que tudo é cor-de-rosa. Nem tudo é cor-de-rosa. Não será, enquanto continuarmos ignorando os danos que nossos modelos econômicos atuais causam à natureza.
A meta 14 do QGB exige a integração da biodiversidade e dos seus valores nas políticas e na contabilidade nacional. O Secretário-Geral da ONU fez um apelo para ir além do PIB. Precisamos atender a esses chamados. E tomar medidas concretas com base nessas medições.
Três, tomar medidas holísticas em relação à tripla crise planetária
Essa iniciativa sobre a natureza é ótima. Mas não resolverá os problemas sozinha. Tudo está conectado. Por exemplo, as alterações climáticas são um dos principais motores da perda de natureza e de biodiversidade, pelo que temos de cumprir os objetivos do Acordo de Paris.
A poluição é outro fator, por isso temos de fazer um acordo forte para acabar com a poluição por plástico. Um rascunho zero do acordo está na mesa para negociação em novembro. Assim como todo o resto, esse acordo deve proporcionar mudanças econômicas que cessem os impactos na natureza e na biodiversidade na origem. Isso significa repensar o design de plásticos, não apenas tentar evitar ou mitigar o aspecto da poluição por meio da reciclagem.
Para viver em harmonia com a natureza, precisamos cumprir todos os compromissos ambientais internacionais e tomar ações que proporcionem múltiplos benefícios.
Amigos,
Essa iniciativa também visa aumentar o apoio da ONU aos países que transitam para o manejo e uso sustentável da natureza. O Programa da ONU para o Meio Ambiente (PNUMA) e a ONU em geral estão empenhados em fornecer esse apoio.
As agências da ONU prometeram integrar a biodiversidade em seu trabalho por meio da Abordagem Comum à Biodiversidade e das Soluções Baseadas na Natureza. Todavia, o impulso ainda está para ser tomado. Por isso, apelo às agências das Nações Unidas para que façam mais, seja por meio de empréstimos concessionais ou de uma programação baseada em subvenções que deem conta das dependências da natureza.
O apoio da ONU aos planos de ação nacionais em matéria de biodiversidade – por meio do PNUMA, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e do Fundo Global para o Meio Ambiente – precisa estar alinhado ao planejamento e aos orçamentos nacionais de desenvolvimento. E precisa considerar os riscos, e é por isso que o Escritório das Nações Unidas para Redução do Risco de Desastres tem um papel a desempenhar. O sistema da ONU também deve fazer mais para se alinhar por meio de abordagens de equipes de países.
Além de usar a natureza de forma sustentável, é preciso também trazer de volta o que foi perdido. É por isso que o PNUMA, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e outros estão apoiando compromissos para restaurar um bilhão de hectares de terra sob a Década da Restauração de Ecossistemas.
Vejam, todos concordamos que estamos fora do caminho certo para alcançar os ODS e as metas sobre clima, biodiversidade e poluição. Que o direito a um ambiente saudável segue sendo uma aspiração digna e não uma realidade. Nada disso mudará se não transformarmos nossa relação com a natureza.
Podemos fazer isso? Claro que sim. Mas tudo começa com a compreensão de que a natureza não é um combustível sem fim para alimentar os motores do crescimento econômico. Que a humanidade não está acima ou à parte da natureza. Somos parte da natureza. É hora de começarmos a nos comportar como tal.