A chef e apresentadora de televisão de Dubai, Leyla Fathallah, se deparou recentemente com uma tigela de uvas que começavam a estragar. Mas, em vez de jogá-las fora, ela as integrou à massa de um brioche e postou uma foto dele no Instagram, onde ela tem 1,3 milhão de seguidores.
"Recebi muitos comentários de pessoas dizendo 'por favor, continue nos dando ideias de como usar restos de comida'", disse Fathallah.
Como fundadora da recém-lançada Fitkult, que faz refeições prontas, o desperdício de alimentos se tornou uma preocupação diária para Fathallah. A empresa dela prepara três pratos por dia para sua crescente lista de clientes. Ela aprendeu a calcular a quantidade exata de ingredientes necessários para cada refeição para que seus chefs nunca cozinhem mais do que o necessário.
Fathallah faz parte de um número crescente de chefs que estão tentando combater o que eles chamam de epidemia de desperdício de alimentos na Ásia Ocidental, onde cerca de um terço de todos os alimentos é desperdiçado. O desperdício está cobrando um preço econômico e ambiental desnecessário em uma região que já luta contra a pobreza e as mudanças climáticas, dizem aqueles no setor.
O desperdício de alimentos não é um problema apenas na Ásia Ocidental. De acordo com o Índice de Desperdício de Alimentos 2021 do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), quase 1 bilhão de toneladas de alimentos desperdiçados foram geradas apenas em 2019. Mais de 60% veio de famílias, 26% do setor de serviços de alimentação e 13% do varejo. Ao todo, o relatório constatou que 17% dos alimentos, da fazenda à mesa, vão para o lixo.
Esses números são particularmente difíceis de engolir, dado que cerca de 3,1 bilhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso a uma dieta saudável e cerca de 828 milhões de pessoas passam fome. Isso, segundo o Índice de Desperdício de Alimentos, prejudica o progresso dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU relacionados à pobreza, à fome, à desigualdade e ao consumo e produção responsáveis.
Quando os alimentos são desperdiçados, todos os recursos que foram usados para os produzir, tais como água, energia para transporte e terra, também são desperdiçados. Além disso, grande parte dos alimentos que são jogados fora acaba em aterros sanitários, onde se decompõem e produzem metano, um potente gás de efeito estufa que contribui para a crise climática.
Estima-se que 34% de todos os alimentos na Ásia Ocidental são desperdiçados, de acordo com um relatório de 2021 do PNUMA sobre o desperdício de alimentos na região. Isso está ocorrendo em uma parte do mundo que mal pode pagar por isso, disse Sami Dimassi, Diretor Regional do PNUMA para a Ásia Ocidental.
"A região é fortemente dependente da importação de alimentos e também está entre as mais vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas devido à escassez de recursos naturais, tais como água, e capacidade limitada de adaptação", diz Dimassi.
Há muitos contribuintes para o desperdício de alimentos em todo o mundo. Isso inclui um planejamento precário da quantidade de comida necessária ao fazer compras, armazenamento inadequado e congelar e cozinhar ou servir comida demais.
Há também influências culturais que podem contribuir para o alto desperdício de alimentos da Ásia Ocidental, dizem aqueles na indústria. Issa Albalushi é chef no Restaurante Al Mouj Golf, em Mascate, e presidente da Oman Chefs Guild. Ele costuma ver comida sendo desperdiçada em eventos sociais, como casamentos.
Albalushi disse que o desperdício de alimentos já foi comum em seu restaurante, que atende 200 pessoas em dias normais e até 1.000 para eventos especiais.
No entanto, ele instituiu recentemente um novo sistema para rastrear o peso exato dos ingredientes em cada prato. Sua equipe também separa as sobras de alimentos em duas categorias: os alimentos que não foram servidos aos clientes são doados para comunidades desfavorecidas e os alimentos que foram servidos são divididos em carne e vegetais para servir de alimento para gado e animais de estimação. Isso reduz a quantidade de alimentos que acabam em aterros sanitários produzindo metano, um potente gás de efeito estufa.
A redução do desperdício alimentar é uma parte crítica do combate às alterações climáticas. O desperdício de alimentos é responsável por 8% a 10% das emissões globais de gases de efeito estufa, contribuindo para um clima instável e eventos climáticos extremos, como secas e inundações.
Para aumentar a conscientização sobre as consequências do desperdício de alimentos, em 2019, o PNUMA e a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura lançaram o Dia Internacional de Conscientização sobre a Perda e o Desperdício de Alimentos.
O PNUMA também lançou a campanha Receita de Mudança, que incentiva os consumidores da Ásia Ocidental a serem conscientes do desperdício de alimentos. A iniciativa visa a acelerar o progresso para alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 12, que abrange o consumo e a produção sustentáveis.
Além disso, uma iniciativa do PNUMA, Oportunidades Globais para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, ajudou 25 países da Ásia-Pacífico, Ásia Ocidental, África e América Latina e Caribe a desenvolver estratégias nacionais para reduzir a perda e o desperdício de alimentos.
Para muitos, combater o desperdício de alimentos pode parecer uma tarefa árdua que deve ser deixada para governos e instituições. Porém, para Leyla Fathallah, o processo começa nas cozinhas. "É preciso um pouco mais de trabalho, criatividade e experimentação. Ensine essas habilidades aos seus filhos para que eles possam aprender o hábito de não desperdiçar comida."