Quando a designer Batoul Al-Rashdan conta que faz roupas com azeitonas moídas e cascas de cebola, algumas pessoas ficam surpresas.
"É definitivamente um quebra-gelo ", diz a fundadora da casa de moda jordaniana Studio BOR, rindo. "Mas uma vez que [as pessoas] aprendem mais sobre isso, elas ficam tipo, 'Ok, interessante'."
Al-Rashdan tem falado muito sobre seu trabalho ultimamente. Nos últimos anos seus vestidos, bolsas e outros acessórios à base de plantas são vistos nas passarelas ao redor do mundo e lhe renderam uma série de prêmios. As criações são projetadas para se deteriorar com o tempo, diferenciando-as das montanhas de tecidos sintéticos duradouros que entopem aterros sanitários no mundo todo.
"Essas [roupas] não foram feitas para durar para sempre", diz Al-Rashdan, que recentemente participou em um programa de mentoria organizado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pelo parceiro Fashion Trust Arabia. "Eles serviram o seu propósito. Eles podem ir embora."
Al-Rashdan faz parte de uma onda de designers, muitos jovens, com o objetivo de reduzir o custo crescente que os resíduos do setor de moda e têxtil estão tendo no planeta. Globalmente, a produção de roupas mais do que dobrou desde 2000, alimentando a poluição e as mudanças climáticas e consumindo recursos naturais e espaços selvagens. Muitos estão esperançosos de que um grupo emergente de designers conscientes ambientalmente possa ajudar a afastar o setor de sua obsessão por têxteis baratos e descartáveis, o que, segundo especialistas, está na raiz de seus problemas ambientais.
"Grande parte do mundo precisa repensar completamente sua relação com roupas", diz Sami Dimassi, diretor regional do PNUMA para a Ásia Ocidental. "A cultura do descarte que domina a moda precisa acabar se quisermos não apenas proteger o planeta, mas proteger nós mesmos."

Em 30 de março, o mundo observa o Dia Internacional do Resíduo Zero, que explora maneiras de reduzir os mais de 2 bilhões de toneladas de lixo que a humanidade produz a cada ano. Neste ano, a data se concentrará no setor de moda e têxteis e nos perigos da fast fashion, o modelo de negócios que valoriza a produção vertiginosa de roupas baratas e atuais.
É um tema importante para Hazem Kais, um designer de 31 anos de Beirute, Líbano. Chefe da casa de moda GoodKill, ele tem se preocupado com o impacto da moda na Terra por muito tempo.
"Tudo o que fizemos está voltando para nos assombrar", diz Kais, que recentemente trabalhou com especialistas do PNUMA para reduzir a quantidade de tecido que usa em suas roupas. "É tarde demais para questionar que temos que ser mais sustentáveis."
Kais maneja uma pequena operação focada em peças duráveis e personalizadas, que ele diz são inerentemente mais sustentáveis do que as roupas produzidas em massa que dominam a indústria da moda. Ele também se afastou de muitos corantes químicos agressivos, que podem se infiltrar no meio ambiente, poluindo a terra, o mar e o ar. Em vez disso, ele costuma colorir suas roupas com extratos de coisas como sálvia, noz e romã.
Kais, cujo bairro foi abalado por bombardeios durante a recente escalada dos conflitos na região, diz que encontra um pouco de paz no processo de tingimento. Isso inclui ferver produtos para criar os verdes e marrons profundos que caracterizam sua última coleção, que será lançada em alguns meses. "É meu ritual matinal", diz ele. "Além disso, faz parte de um ciclo natural. Se podemos [tingir roupas dessa maneira], por que não faríamos?"

Para apoiar mais empresas como a GoodKill, o PNUMA lançou a Academia de Moda Sustentável da Ásia Ocidental (West Asia Sustainable Fashion Academy) em 2021. Até agora, forneceu orientação e treinamento para 150 designers promissores, estudantes de escolas de moda, proprietários de pequenas empresas e grupos sem fins lucrativos, ajudando-os a fazer roupas de forma mais sustentável. Ele mostrou aos participantes como obter tecidos ecologicamente corretos, extrair pigmentos de plantas, usar menos recursos e ser criativos na escolha de materiais.
A academia também ajudou a escola de design de moda na Universidade Libanesa Americana a incorporar a sustentabilidade em seu currículo. Um designer criou uma coleção com cerdas de pincel; outro fez um casaco com cadarços. Especialistas admitem que a indústria da moda precisa reformular completamente seu modelo de negócios para se tornar mais sustentável. Embora relativamente pequenos, eles acreditam que esforços como a Academia de Moda Sustentável da Ásia Ocidental (West Asia Sustainable Fashion Academy) são um bom lugar para iniciar o processo.
"Esses designers são o futuro da indústria", diz Dimassi, do PNUMA. "Se pudermos mostrar a eles uma maneira mais sustentável de fazer roupas, a esperança é que essas práticas um dia se tornem populares."
A academia de moda faz parte de um esforço mais amplo do PNUMA de tornar a indústria da moda mais sustentável. O trabalho do PNUMA inclui apoiar e informar governos, abordar a superprodução e o consumo excessivo e ajudar as partes interessadas da indústria em países em desenvolvimento, particularmente empresas menores, na mudança para modelos de negócios circulares para reduzir sua pegada ambiental.
Todos os anos, 92 milhões de toneladas de resíduos têxteis são produzidos globalmente. Isso equivale a um caminhão de lixo cheio de roupas incineradas ou despejadas em aterros a cada segundo, de acordo com a Fundação sem fins lucrativos Ellen MacArthur. Muitas dessas roupas indesejadas acabam em países em desenvolvimento - muitas vezes sob o pretexto de reciclagem - onde se decompõem lentamente, liberando produtos químicos e microplásticos nos solos e nas águas. Enquanto isso, a indústria da moda sozinha é responsável por até 8% de todas as emissões de gases de efeito estufa e é uma das maiores consumidoras de água do mundo.
Um relatório do PNUMA de 2023 revelou que, para reduzir sua pegada ambiental, a indústria da moda deve fabricar menos roupas em mercados superlotados, projetar roupas mais duráveis, evitar o uso de produtos químicos perigosos, evitar o derramamento de microfibras, desviar roupas dos aterros sanitários por meio de programas de reutilização e reciclagem e desencorajar o consumo excessivo.
A moda tem um dos motores de marketing mais poderosos e sua mensagem é simples: compre, compre, compre”, diz Dimassi. “Essa mensagem precisa mudar se quisermos ter alguma esperança de tornar a indústria mais sustentável.”
Nos últimos anos, muitos designers convencionais começaram a adotar a sustentabilidade. Um número crescente de marcas de moda e fabricantes de roupas estabeleceu metas alinhadas com uma carta da ONU projetada para reduzir as emissões de gases de efeito estufa do setor da moda. Outros tomaram medidas importantes para reduzir a poluição e diminuir seu impacto na natureza.
Em fevereiro, profissionais da indústria, incluindo da casa de moda inglesa Stella McCartney, lideraram um workshop organizado pelo PNUMA sobre moda sustentável em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. O evento mostrou aos jovens designers como obter materiais de forma ética, usar práticas de negócios mais circulares e comunicar sobre a importância da sustentabilidade.

Al-Rashdan, a designer da Jordânia, participou desse workshop, que ela chamou de "relevador".
"Foi muito inspirador ver como outros designers estão adquirindo seus materiais [e] abordando a sustentabilidade de diferentes perspectivas."
Engenheira arquitetônica de profissão, ela começou a experimentar com têxteis à base de plantas em 2015, descobrindo como transformar resíduos em um material biodegradável. Al-Rashdan então insere o material numa impressora 3D, criando uma série de acessórios. Entre outras coisas, ela criou moedas jordanianas de aparência clássica com cascas de cebola (ainda fortes dois anos depois) e uma bolsa com uma combinação de materiais baseados no planeta (um pouco pior para o desgaste depois de ser levada ao redor do mundo). Ela também colaborou com o renomado estilista Tony Ward em um vestido biodegradável fino que estreou na Paris Haute Couture Fashion Week, um dos eventos mais proeminentes do calendário da moda.
Por enquanto, materiais da próxima geração como os que ela fabrica representam um nicho de mercado. Mas a consultora BCG afirma que, até 2030, poderiam representar 8% do mercado global de fibras, o equivalente a 13 milhões de toneladas de material.
Al-Rashdan diz que se sente esperançosa ao ver as principais casas de design adotarem a sustentabilidade, mas admite que ainda há um longo caminho a percorrer na indústria da moda.
“Eu estou otimista,” ela diz. “Cada mudança, mesmo pequena, conta.”
O Dia Internacional do Resíduo Zero, comemorado em 30 de março, foi estabelecido por meio da Resolução 77/161 da Assembleia Geral da ONU e é facilitado conjuntamente pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (UN-Habitat). Este dia tem como objetivo aumentar a conscientização sobre o papel crítico da gestão de resíduos e do consumo e produção responsáveis para alcançar o desenvolvimento sustentável. Ele pede que indivíduos e organizações adotem uma abordagem de ciclo de vida, com foco na redução do uso de recursos e emissões ambientais em todas as etapas do ciclo de vida de um produto.