Entrevista com o diretor e coordenador do Programa da ONU “Great Apes Survival Partnership”, Johannes Refisch
Tanto a pesquisa quanto o turismo de observação de primatas permitiram que as pessoas aprendessem mais sobre chimpanzés, bonobos, gorilas e orangotangos, além de os observarem de perto. Essa prática turística também é uma importante fonte de renda para os governos e comunidades - e uma proporção significativa do valor arrecadado é utilizado para a proteção de espécies ameaçadas e de seus habitats naturais.
No entanto, patologias infecciosas como o COVID-19 – causada pelo vírus SARS CoV-2 – são uma grande preocupação para a conservação dessas espécies.
Tanto os seres humanos quanto os grandes primatas são suscetíveis a doenças infecciosas, e a introdução de patógenos humanos nessas populações pode resultar em perdas catastróficas.
Johannes Refisch é o diretor e coordenador do Programa“Great Apes Survival Partnership”, da ONU. Nessa entrevista, ele explica por que a prevenção de doenças é fundamental e quais medidas específicas estão sendo tomadas para proteger esses animais.
Em relação aos grandes primatas, por que o vírus SARS CoV-2 é uma preocupação?
A possibilidade de infecção é um risco para a conservação dessas espécies. Ainda não sabemos se os macacos são suscetíveis ao vírus SARS CoV-2, mas sabemos que os chimpanzés selvagens foram infectados com o coronavírus humano OC43 na Costa do Marfim e que os primatas podem ser infectados por muitos outros patógenos respiratórios humanos.
Entre as pessoas, o vírus SARS CoV-2 é altamente infeccioso e pode sobreviver no ambiente por alguns dias. Sendo assim, devemos presumir que os macacos também são suscetíveis e impedir que sejam infectados.
Quais são as possíveis consequências da infecção entre os grandes primatas?
A sobrevivência desses animais já está ameaçada pela perda de habitat, caça ilegal e outras doenças. O Ebola – uma febre hemorrágica que afeta humanos e macacos –, por exemplo, tem até 95% de taxa de mortalidade em gorilas. E cálculos indicam que algumas dessas populações precisarão de mais de 130 anos para se recuperarem. A contração do SARS-CoV-2 poderia piorar esse quadro.
Também haveria perdas econômicas e de meios de subsistência. O turismo de observação de primatas é uma fonte importante de empregos, de geração de renda para governos nacionais e comunidades locais e de produção de fundos para sustentar as atividades de conservação.
Além disso, é importante observar o risco de infecção humana por macacos. Devido a nossa proximidade genética, os seres humanos podem tanto transmitir doenças a estes animais como contraí-las deles. Novamente, o Ebola exemplifica um caso em que tanto as pessoas quanto os primatas foram afetados. Existem evidências de que caçadores encontraram carcaças de gorilas que morreram de Ebola e contraíram a doença quando consumiram a carne infectada.
O que está sendo feito para reduzir esses riscos?
No momento, não há vacina contra o SARS CoV-2 – e pode levar meses, se não anos, para que desenvolvam uma.
Enquanto isso, o Grupo Especialista em Primatas da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN), o grupo Seção sobre Grandes Primatas (Section on Great Apes, em inglês) e o Grupo Especialista em Saúde de Animais Selvagens (Wildlife Health Specialist Group, em inglês) publicaram um comunicado conjunto, recomendando que “as visitas de seres humanos a antropoides sejam reduzidas ao mínimo necessário para garantir a segurança e saúde desses animais”. Enfatizaram também que a adesão estrita às boas práticas para o turismo de observação de macacos e a prevenção de doenças são fundamentais.
Além disso, recomendam que sejam consideradas a suspensão dessa prática turística e a redução de pesquisas de campo sobre primatas e apelaram por mecanismos "que compensem a redução do lucro e dos empregos desse setor" e apoiem a saúde pública nas comunidades locais. Por isso, em 23 de março de 2020, grande parte dos locais de observação de macacos foram fechados.
A longo prazo, será essencial entender a propagação de doenças entre animais e seres humanos, pois há cada vez mais evidências de que a perda de habitat e da biodiversidade tem facilitado a disseminação de zoonoses.
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