Embora os Estados-membros tenham adotado uma resolução sobre infraestrutura sustentável na Assembleia Ambiental das Nações Unidas (UNEA), em março, a Cúpula das Cidades reforçou no mesmo mês em Nairóbi, no Quênia, a importância da ação local e a necessidade de uma abordagem integrada para a infraestrutura urbana.
Sessenta por cento dos resíduos e três quartos do uso de recursos e de emissões de gases de efeito estufa vêm das cidades, o que as torna ótimos lugares para promover o consumo e a produção sustentáveis.Mas preservar o bem-estar de uma população cada vez mais urbana, incluindo pessoas que ainda não têm acesso a moradias e serviços básicos acessíveis e adequados, é tão importante quanto a busca por atingir as metas de desenvolvimento sustentável.
Uma abordagem integrada à infraestrutura urbana poderia ajudar ambas..
No bairro paulistano de Jardim Helian, cerca de 14 mil pessoas vivem em um assentamento informal, onde a natureza não planejada da área levou a problemas óbvios.
“Uma das questões é quando as casas invadem o território do rio, levando à canalização forçada [que causa enchentes durante a estação chuvosa]”, disse o morador Mohammed. “Outra é que o esgoto é jogado diretamente no riacho.”
O Programa Cidades Sustentáveis e a ONU Meio Ambiente estão ajudando a criar uma “abordagem de vizinhança” integrada, que aborda vários problemas ambientais, reunindo os moradores locais com o governo e incluindo suas preocupações no planejamento da cidade. Os estilos de vida já estão se tornando mais sustentáveis graças à intervenção.
De acordo com o relatório do painel internacional Weight of Cities, otimizar sistemas e criar sinergias intersetoriais entre edifícios, mobilidade, energia e urbanismo pode reduzir as emissões de gases de efeito estufa e o uso de recursos em até 55%.
“Perto de 70% da infraestrutura urbana que veremos em 2050 ainda está para ser construída”, disse Joyce Msuya, diretora-executiva interina da ONU Meio Ambiente, durante a cúpula. “É uma enorme oportunidade para resolver diferentes (problemas) em nossas cidades e (conseguir) investimentos de longo prazo.”
A chefe do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos (ONU-HABITAT), Maimunah Mohd Sharif, que abriu a cúpula ao lado de Joyce Msuya, concordou afirmando que as cidades são onde “os desafios mais severos decorrentes das mudanças climáticas provocadas pelo homem terão que ser enfrentados”.
Organizada por ONU Meio Ambiente, ONU-HABITAT, United Cities and Local Governments (UCLG), ICLEI e Global Task Force and Cities Alliance, a Cúpula das Cidades ocorreu na capital queniana no dia 13 de março.
Soluções em todos os lugares
Existem muitas soluções, como supermercados inteligentes e sistemas distritais de energia, que permitem maior integração. A cadeia de varejo Aktiv & Irma, na Alemanha, por exemplo, instalou um sistema integrado que liga refrigeração, iluminação, aquecimento, ventilação e ar condicionado. Isso otimiza o uso de energia e reduz seus custos em 20%.
“Lembre-se de que sempre que você coloca sua mão atrás da geladeira, está quente. E hoje, a maioria dos supermercados não usa esse calor”, disse Ziad Al Bawaliz, diretor-executivo da fabricante de aparelhos de refrigeração Danfoss. “Ao usar o calor residual de todos os supermercados na Europa, poderíamos substituir dez usinas de carvão”.
Com um sistema distrital de energia — uma rede de tubulações subterrâneas que aquecem ou resfriam vários edifícios — o calor desperdiçado pode até ser armazenado. Isso inclui o calor de data centers, da indústria e de sistemas de metrô, como visto em países como Chile, Japão e Coreia do Sul.
Mas a integração também é necessária em diferentes níveis, da governança vertical a planejamento, política e finanças horizontais e intersetoriais.
“Uma cidade sustentável precisa de infraestrutura sustentável e uma abordagem integrada, holística e circular para os desafios da sustentabilidade”, disse Tserenbat Namsrai, ministro do Meio Ambiente e do Turismo da Mongólia, que apoiou a resolução sobre a criação de infraestrutura sustentável.
A Cúpula das Cidades mostrou que governos locais visionários, empresas e comunidades estão desenvolvendo soluções que ligam sistemas como transporte, energia, habitação, água e resíduos. Algumas cidades estabeleceram altas metas de clima e/ou circularidade.
Osaka, no Japão, inclui políticas de energia e medidas de mudança climática no planejamento do desenvolvimento urbano para possibilitar soluções integradas. Dakar, no Senegal, enfatizou a necessidade de bons dados para empreender um planejamento holístico, enquanto Buenos Aires e o Ministério do Meio Ambiente na Argentina demonstraram como diferentes níveis de governo podem abordar conjuntamente o manejo sustentável de território, transporte e energia.
Uma nova iniciativa sobre infraestrutura
A integração de parceiros é igualmente importante, e é por isso que empresas líderes — incluindo ENGIE, Siemens, JCI e Danfoss — disseram na Cúpula que unirão forças com a ONU Meio Ambiente em uma nova parceria público-privada para promover e implementar a integração de sistemas urbanos.
“A tecnologia está lá, os recursos existem, mas precisamos de capacidade”, disse Michael Schack, diretor de redes e cogeração da ENGIE. “Somente a ONU pode resolver essa lacuna. E nós, como setor privado, estamos prontos para lançar uma nova parceria com a ONU Meio Ambiente.”
O novo programa de Integração de Sistemas Urbanos da ONU Meio Ambiente ajudará os governos locais e nacionais a acelerar suas transições para economias circulares e de baixo carbono, aumentar a eficiência e reduzir as demandas de recursos das cidades, melhorando a saúde e o bem-estar. Os países participantes, incluindo Coreia do Sul, Polônia e Alemanha, também expressaram apoio a essa parceria.
“Nossa especialidade é integrar as coisas na Coreia do Sul, e estamos prontos para ajudar qualquer cidade e país a acelerar a integração”, disse Benjamin Yoon da Korean District Heating Corp e membro da delegação sul-coreana na Assembleia Ambiental da ONU.
A iniciativa visa apoiar as cidades no desenvolvimento de abordagens integradas para políticas e planejamento de infraestrutura intersetorial e na implementação de tecnologias-chave que possam facilitar conexões e interações entre edifícios, energia, transporte, tratamento de águas residuais e gerenciamento de resíduos.
Como disse no painel de encerramento da cúpula o enviado especial do secretário-geral das Nações Unidas para a Cúpula do Clima de 2019, Luis Alfonso de Alba, “precisamos de ações climáticas concretas, ousadas e ambiciosas”.